Já perdi a conta do número de vezes que esta foi a primeira frase da consulta médica. Doutor, tenho hérnia desde 1900 e nada, de vez em quando tenho crises horríveis etc e etc.

Existe aqui uma confusão conceitual, frequente não apenas entre os pacientes leigos, mas, também entre médicos bastante experientes. Explico melhor:

A coluna vertebral é formada por vários ossos (as vértebras), empilhadas uma em cima da outra. Entre as vértebras existe o “disco intervertebral” que é uma estrutura complexa e cheia de água que funciona como amortecedor entre as vértebras. O próprio disco contém uma estrutura mais interna chamada de NUCLEO PULPOSO e uma estrutura mais externa chamada de ANEL FIBROSO.

Toda esta estrutura começa a envelhecer muito cedo, antes mesmo dos 20 anos de idade. Este envelhecimento é caracterizado, entre outras coisas, pela perda da hidratação do disco e surgimento de fissuras no anel fibroso, por onde o núcleo pulposo começa a se esgueirar e, eventualmente, acaba saindo para fora. Isto é chamado de hérnia discal.

A confusão foi bastante estimulada pelo advento da ressonância magnética que é capaz de mostrar a desidratação e a hérnia discal com muita facilidade.  O problema é que estas alterações ocorrem muito frequentemente em pessoas que nunca sentiram absolutamente nada. São alterações que vão aumentando com o envelhecimento (independentemente de sentirmos dor ou não).

Por outro lado, eventualmente, a hérnia discal causa uma inflamação na raiz do nervo ciático levando a dor na perna (ou Ciática).

Este diagnóstico é clínico e não radiológico. O padrão da dor permite ao médico estabelecer qual raiz nervosa foi acometida. Quase sempre, este é um evento agudo, ou seja, de curta duração, e não uma doença crônica da qual sofremos há vários anos.  Em outras palavras, enquanto a alteração na radiologia pode existir para sempre, o diagnóstico clínico de hérnia discal é um evento pontual.

Sofrer de dor lombar cronicamente envolve muitos fatores e não apenas a degeneração do disco intervertebral que é observada de maneira inespecífica na ressonância magnética ou tomografia computadorizada. É preciso cuidado nestes conceitos pois, enganos podem levar a cirurgias desnecessárias e com resultados ruins.